Empresas Divertidas

Como eu classificaria as companhias brasileiras com base na minha experiência com Melhores e Maiores.    

Por 25 anos analisei as 1.000 maiores empresas do Brasil, e muitos professores de administração me perguntam como eu classificaria as companhias brasileiras com base nessa experiência.

Daria um livro, mas resumindo em uma única página, diria que existem cinco tipos de empresas no país.

A empresa Tipo A é aquela na qual somente o dono se diverte.

Tudo gira em torno dele, tudo é feito do jeito dele. Ele é o verdadeiro Deus de sua companhia e assim consegue implantar rapidamente sua visão do negócio. É o “empresário bem-sucedido” que aparece em capa de revistas, invariavelmente sozinho.

É o dono da verdade, de tudo e de todos. Não preciso dizer que os demais integrantes dessas empresas não se divertem nem um pouco, não é esse o seu objetivo.

A empresa Tipo B é aquela em que somente os filhos do dono se divertem.

O pai, com 75 anos, ainda a controla com mão-de-ferro, mas isso já não é tão fácil como antigamente. Ele está ficando gagá, só que não percebe e já não se diverte como antes. Ele nunca quis fazer a transição de uma empresa familiar para uma profissional, muito menos entregar a companhia aos filhos.

Para manter-se no poder, comprou-lhes iates e BMWs e deu-lhes cargos no conselho para fazer absolutamente nada. Não conseguindo salário compatível em nenhum outro lugar, os filhos resignados se deleitam fazendo cruzeiros mundo afora.

No fundo, são os únicos que se divertem.

A empresa Tipo C é aquela onde ninguém mais se diverte.

O pai chegou aos 90 anos e finalmente morreu sem deixar uma equipe de administradores profissionais que pudesse salvar a companhia. Os filhos chamados às pressas do Caribe começam a brigar entre si, porque também só entendem de iates e BMWs.

A empresa vai de mal a pior, e os filhos se safam vendendo-a a uma multinacional. E aí nossa elite empresarial não entende por que todos os empregados, trabalhadores e sindicalistas de empresas A, B e C são de esquerda e por que temos tantos intelectuais e professores de filosofia marxistas querendo acabar com tudo isso que está aí.

A empresa Tipo D é aquela na qual todo mundo se diverte.

Ela não tem um único dono, é uma associação coletiva de pequenos acionistas, a maioria formada de trabalhadores da própria empresa, fundos de pensão de trabalhadores, da classe média, de médicos e engenheiros, poupando para a aposentadoria, para não depender do salário dos filhos.

São as empresas de capital democrático, em que não há ações sem direito a voto, onde todos votam, como essas companhias listadas no novo mercado transacionadas todo dia na Bovespa.

Elas são a concretização moderna do sonho de Karl Marx, nas quais trabalhadores e consumidores são acionistas diretos das empresas em que trabalham ou compram, detendo assim os meios de produção.

O mundo marxista que quer os meios de produção estatizados na mão de brilhantes economistas, não é marxismo e sim fascismo.

Normalmente, o presidente dessas empresas é um administrador profissional, funcionário demissível a qualquer momento, como todos os outros. Nada de cargo vitalício como nas dos tipos A, B e C nem indicações por apadrinhamento político como nas empresas Tipo G, G de governo. O presidente dessas companhias é escolhido pela competência administrativa, e não pelo parentesco familiar ou loteamento político. Como esse administrador depende da cooperação de todos para manter-se no poder, a opinião geral é ouvida, todo mundo faz parte da solução, ele acredita no trabalho de equipe. As ideias de todos são desejadas e levadas a sério.

Nessas empresas, o presidente não destrata nem desrespeita os subordinados, jamais berra em público, não é o dono da verdade, caso contrário não sobreviveria.

São empresas preocupadas com o social, e não somente com o bolso do acionista controlador, que nessas empresas nem existe. O D é de Divertido, Diversificado e Democrático.

Essas são as melhores companhias para trabalhar no Brasil, infelizmente muito raras devido à proliferação de empresas dos tipos A, B, C e G. Mas empresas Tipo D estão sendo criadas todo dia.

Um outro mundo é possível, mais democrático, mais bem administrado, mais includente, mais socialmente responsável e muito mais divertido.

Revista Veja, novembro de 2005.

Nota. Este artigo me deu algum problema, já que todos os funcionários da Abril identificaram claramente que tipo de empresa a Abril era. O patrão não gostou. 

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Comentários

4 Responses

  1. “Essas
    são as melhores companhias para trabalhar no Brasil, infelizmente muito
    raras devido à proliferação de empresas dos tipos A, B, C e G.”

    Pois é mestre …. e infelizmente de 2005 pra cá a proliferação das ABCG foi imensa é um caso raro encontrar um D.

      1. Mas o professor fala no texto de empresas onde os próprios trabalhadores são os donos, estas seriam pequenas e não estariam listadas na Bovespa.

        Entendi errado ou realmente existem bastante empresas assim no Brasil?

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