Se você não gosta de seu trabalho, tente pelo menos fazê-lo bem feito.
A escolha de uma profissão é o primeiro calvário de todo adolescente. Muitos tios, pais e orientadores vocacionais acabam recomendando “fazer o que se gosta”, um conselho confuso e equivocado.
Empresas pagam a profissionais para fazer o que a comunidade acha importante ser feito, não aquilo que os funcionários gostariam de fazer, que normalmente é jogar futebol, ler um livro ou tomar chope na praia.
Seria um mundo perfeito se as coisas que queremos fazer coincidissem exatamente com o que a sociedade acha importante ser feito. Mas, aí, quem tiraria o lixo, algo necessário, mas que ninguém quer fazer?
Muitos jovens sonham trabalhar no terceiro setor porque é o que gostariam de fazer. Toda semana recebo jovens que querem trabalhar em minha consultoria num projeto social. “Quero ajudar os outros, não quero participar desse capitalismo selvagem.” Nesses casos, peço que deixem comigo os sapatos e as meias e voltem para conversar em uma semana.
É uma arrogância intelectual que se ensina nas universidades brasileiras e um insulto aos sapateiros e aos trabalhadores dizer que eles não ajudam os outros. A maioria das pessoas que ajudam os outros o faz de graça.
As coisas que realmente gosto de fazer, como jogar tênis, velejar e organizar o Prêmio Bem Eficiente, eu faço de graça. O “ócio criativo”, o sonho brasileiro de receber um salário para “fazer o que se gosta”, somente é alcançado por alguns professores felizardos de filosofia que podem ler o que gostam em tempo integral.
O que seria de nós se ninguém produzisse sapatos e meias, só porque alguns membros da sociedade só querem “fazer o que gostam”? Pediatras e obstetras atendem às 2 da manhã. Médicos e enfermeiras atendem aos sábados e domingos não porque gostam, mas porque isso tem de ser feito.
Empresas, hospitais, entidades beneficentes estão aí para fazer o que é preciso ser feito, aos sábados, domingos e feriados. Eu respeito muito mais os altruístas que fazem aquilo que tem de ser feito do que os egoístas que só querem “fazer o que gostam”.
Então teremos de trabalhar em algo que odiamos, condenados a uma vida profissional chata e opressiva? Existe um final feliz. A saída para esse dilema é aprender a gostar do que você faz. E isso é mais fácil do que se pensa. Basta fazer seu trabalho com esmero, bem feito. Curta o prazer da excelência, o prazer estético da qualidade e da perfeição.
Aliás, isso não é um conselho simplesmente profissional, é um conselho de vida. Se algo vale a pena ser feito na vida, vale a pena ser bem feito. Viva com esse objetivo. Você poderá não ficar rico, mas será feliz. Provavelmente, nada lhe faltará, porque se paga melhor àqueles que fazem o trabalho bem feito do que àqueles que fazem o mínimo necessário.
Se quiser procurar algo, descubra suas habilidades naturais, que permitirão que realize seu trabalho com distinção e o colocarão à frente dos demais. Muitos profissionais odeiam o que fazem porque não se prepararam adequadamente, não estudaram o suficiente, não sabem fazer aquilo que gostam, e aí odeiam o que fazem mal feito.
Sempre fui um perfeccionista. Fiz muitas coisas chatas na vida, mas sempre fiz questão de fazê-las bem feitas. Sou até criticado por isso, porque demoro demais, vivo brigando com quem é incompetente, reescrevo estes artigos umas quarenta vezes para o desespero de meus editores, sou superexigente comigo e com os outros.
Hoje, percebo que foi esse perfeccionismo que me permitiu sobreviver à chatice da vida, que me fez gostar das coisas chatas que tenho de fazer.
Se você não gosta de seu trabalho, tente fazê-lo bem feito. Seja o melhor em sua área, destaque-se pela precisão. Você será aplaudido, valorizado, procurado, e outras portas se abrirão. Começará a ser até criativo, inventando coisa nova, e isso é um raro prazer.
Faça seu trabalho mal feito e você odiará o que faz, odiando a sua empresa, seu patrão, seus colegas, seu país e a si mesmo.
Revista Veja, novembro de 2004
26 respostas
ótimo texto. Tem uma frase de que gosto muito, que vai de encontro com este artigo.
TODO TRABALHO BEM FEITO É UM TEMPO BEM APROVEITADO.
Sempre que estou fazendo algo que considero difícil penso nesta frase, e procuro fazer o meu melhor…
Ir de encontro é contra e ir ao encontro é a favor.
Não concordo contigo quando diz que as pessoas não gostam do que fazem quando não se prepararam bem para isso. Se você não gosta, pode ser Phd e isso não mudará em nada o apreço pelo seu oficio. Fazer o que gosta inclui algumas coisas que não gostamos, e isso pode incluir recolher lixo. Nada é 100% bom. Se amo ser pediatra, o fato de trabalhar as duas da manhã sera relevante. Agora, se eu não amar o que faço, detestarei meu oficio a qualquer hora do dia. Se amo, faço bem feito. Seja ser sapateiro, lixeiro, medico…quem disse que o lixeiro odeia o que faz? Tudo depende do que valorizo em minha vida. Conheço vendedores de amendoin que estão a vida toda com um ponto de venda e são felizes. E conheço alguns que expandiram, inclusive com franquia internacional. Temos que quebrar paradigmas ! E eu entendi o jovem que se acercou a você…espero que esse jovem hoje esteja feliz. Pois conheço poucas pessoas que amam o que fazem..
Acho que concordamos. Quem faz bem feito acaba sendo valorizado pelo que faz, e nao pode deixar de achar isto gostoso. O duro é chegar lá.
Leila
Vc muda esta minha foto horrivel para mim?
Abraços
Stephen Kanitz
@stephenkanitz
EU NUNCA LI NADA TÃO ESTÚPIDO EM TODA A MINHA VIDA.
Quem escreveu este artigo é certamente um frustrado!
Escolher uma profissão que goste não é beber chope na praia, isso nunca foi profissão, ao menos ate a data.
Gostando “ou não” do seu trabalho, faça-o bem feito, mas sempre procure trabalhar em áreas em que tenha interesse e aptidão.
Um profissional frustrado é uma bomba relógio que, em algum momento, vai se tornar improdutivo… ou ter uma vida miserável… ou os dois.
Frustrado? Que frustração! levou a um mestrado em Harward, mas essa não era o conselho do texto? Aprender a gostar do que não gosta. Ta ai, fica a dica, de repente você começa a gostar do artigo.
E daí que levou um mestrado em Harward? Nem Harward e nem “teses” não podem ditar como devo fazer de minha vida em matéria de trabalho!
Valeu a tentativa, mas discordo. Como colocado em alguns comentários, muitas pessoas conformam-se com a condição de insatisfação, outras (pior!) não têm escolha. O traço perfeccionista deve ser visto com bastante cuidado, especialmente em uma sociedade que vende a realização pessoal fundamentada no consumismo o que na maioria das vezes não conduz à realização pessoal – poque, claro, pretende a manutenção do capitalismo e não necessariamente a realização das pessoas. Uma pessoa perfeccionista e conformada é um prato cheito para esse estilo de sociedade. Na minha opinião, esse tipo de perfil vive miseravelmente da expectativa social, de elogios e gratidão (o que nesse contexto é ruim, porque alimenta comportamentos prejudiciais para a própria pessoa, principalmente), do que os outros pensam e não do que genuinamente gostaria de ser. Como o próprio termo diz a realização pessoal tem um caráter pessoal; gera um significado para vida de natureza intrínseca e não é um estilo de vida padrão e predeterminado – como se vende por aí. Cada ser humano é um universo, único, incomparável, com motivações e sentidos INTRANSFERÍVEIS e não devem “desperdiçarem-se” tentando gostar do que lhes é imposto, mas TENTAR fazer o que se gosta.
ps.: Me considero uma pessoa perfeccionista (demorei 30 min. para escrever o comentário), e mesmo assim não me sinto satisfeito/realizado/feliz com qualquer atividade, por mais que a faça bem feita. Na verdade desgosto de um monte de atividades. Contudo, felizmente tive escolha e oportunidade e sou feliz e realizado PORQUE FAÇO O QUE GOSTO.
ABRAÇOS PESSOAL!
Olha, acho q essa visão que você tem é muito pessimista, nao tem nada mais frustrante na vida do que levantar dia após dia e ter que fazer um trabalho que você não gosta, isso pode levar até levar uma pessoa à depressão.
Por mais o indivíduo se esmere e tente fazer tudo com perfeiçao isso é algo que vai apenas agradar ao “ambiente externo”, vai satisfazer aos superiores que esperam isso dele, mas a longo prazo não contribui em nada para a realização pessoal deste funcionário.
Eu já perdi muito tempo em empregos que me enchiam de desgosto, me sugavam todas as energias. Hoje sinceramente priorizo fazer algo que me agrade mais, mesmo que a remuneraçao seja um pouco menor.
A vida é curta demais para se perder tempo sendo infeliz ou se conformando com situações ruins só por estabilidade.
Aprendi a duras penas e concordo com o sr.Kanitz. Os jovens aprendem que têm que fazer o que gostam 100% do tempo e isso é uma utopia. Faço o que gosto e há momentos difíceis. O que falta na educação em casa é o aprendizado de que na vida nem todos os momentos são 100% prazeirosos, que há momentos de frustração sim, por que não?
Excelente texto!
Este texto é uma mentira pura!!!
Em primeiro lugar, jogar tênis, jogar futebol, são “coisas do lazer” e nem tudo mundo gosta de fazer isto. Eu, por exemplo, não gosto de velejar, odeio estar sobre águas!
Em segundo lugar, sobre Médicos e enfermeiras atenderem “aos sábados e domingos não porque gostam, mas porque isso tem de ser feito”, pode ser um terrível engano. Há muitas pessoas, senão a maioria do setor de saúde, que amam a sua profissão. São pessoas vocacionadas e conheci muitos que adoram a loucura dos plantões.
Em terceiro lugar, é somente um louco que acha que quem produz meias e sapatos não goste daquilo que está fazendo. Se o cidadão com toda a sua dedicação projeta um sapato, ou qualquer outra coisa, estaria ele fazendo isto em contradição a si mesmo? Dúvido! Eu não gosto de produzir sapatos e meias e nem tenho os dons para tal coisa, por isto nem me atrevo entrar no setor. Não é minha praia!
Olha, eu poderia escrever uma tese inteira, mas este artigo me dá nojo. Ele simplesmente ignora os dons e a vocação de uma pessoa. Simplesmente não nos incentiva a buscar o melhor. Também não leva em consideração o lema “vivam e deixem viver”.
Adorei o artigo. Vou meditar muito este final de semana e dar uma guinada na minha vida profissional.
Alerta de coxinha! HAHAHAHA “escravo, colocarei-te no açoite, aprenda a amar seu trabalho. Seja escravo com esmero, e sua chibata não será tão dolorosa” ahahahahahahahahahahahahahaha
Cara tem gente que é sapateiro porque o mundo não dá oportunidade de ser outra coisa. Muito fácil ser bem nascido, ter tido oportunidade de morar na América, e mandar o pobre favelado aceitar que o destino dele é ser sapateiro e para ele consertar sapatos feliz, porque é isso que tem pra essa vida. Mas o moleque que é bem nascido e pôde estudar nas melhores escolas tem que se contentar em ser “sapateiro” numa sala com ar condicionado e ganhando 12k mensais. Fácil! HAHAHAHA
Nunca li algo tão frustrante e desanimador.
Quer dizer que escolher uma vocação, uma área que se tenha mais afinidade, é irrelevante.
Não somos meras engrenagens, somos seres humanos e temos sonhos.
Quando tentamos afogar essa essência, entramos num caminho perigoso e perverso.
Por isso que hoje tem tantas pessoas com depressão e problemas como estresse.
Não faça de pouco seu trabalho atual, por mais insuportável que ele seja, tente fazer o melhor possivel, e ao invés de tentar se conformar a gostar dele, nas horas vagas façam cursos, estudem e planejem sólidas mudanças a médio e longo prazo. Voces terão a chance de serem mais felizes.
Como disse o colega abaixo, um profissional frustrado é uma bomba relógio, um dia vai parar pra pensar, e ver que podia ter sido diferente.
Fica aqui minha opinião
Alessandro. Se ainda não leu algo tão frustrante, sempre é tempo. http://exame.abril.com.br/revista-voce-sa/edicoes/193/noticias/e-tudo-por-dinheiro-e-poder
Além dessa matéria, as pesquisas de Jeffrey Pfeffer apontam que é até pior do que o Kanitz propõe. Outras pesquisas informam que os empregados estão valorizando mais o salário e estabilidade do que possibilidade de crescer na carreira. Muito provavelmente porque estão trocando seus sonhos pela realidade.
Eu odeio o meu trabalho. Faço pelo dinheiro. Tento ter satisfação em outras áreas. É muito ruim detestar o que se faz, porque ocupa muito tempo, mas, é assim que é. Acho que nem todos conseguem fazer o que gostam ou mesmo gostar do que fazem. Talvez muito poucos, inclusive. A empresa em que trabalho não tem nada em comum comigo, é ineficiente, reativa, lenta, muito política, pouco técnica, nem sinal de meritocracia. Eu nem espero reconhecimento. Sou um estorvo, porque não elogio quase nada, porque acho quase tudo muito aquém da minha expectativa. Um colega meu até comentou que, para trabalhar nesta empresa era necessário ter uma expectativa muito baixa. Não deve ser verdade, porque eu continuo trabalhando lá. Mas para gostar de trabalhar lá, eu teria que baixar tanto a minha expectativa que nem vou tentar. Acho que não quero. As universidades são um pouco culpadas disso por darem uma ideia falsa, de que as empresas são participativas, modernas, de que para se manter no mercado devem atender bem o cliente, ser eficientes, etc. Basta comparar a satisfação dos clientes com os lucros e será visto que não há relação entre estes. Isso acontece onde há concorrência forte e baixas barreiras de entrada. E essas empresas nunca são muito lucrativas. Fazer parte de uma empresa ineficiente, não é recompensador. Lamento por aqueles que buscam esperanças na opinião dos outros. Achei o texto do Kanitz até bem otimista. Ele espera que as pessoas sejam reconhecidas se gostarem do que fazem. Nem isso eu acho que acontece sempre. Mas, como eu sempre digo: Se fosse tão bom, não te pagavam, te cobravam.
Olá! Percebemos pelos comentários, que este tema é complexo e a individualidade (nossas experiências pessoais) influem diretamente na nossa reflexão. Diante disso, todos os comentários no meu entender tem relevância e nenhum deles pode ser considerado errado e sim pontos de vistas diferentes.
Acredito que uma questão essencial é a maneira que comunicamos as informações e nossa dupla interpretação textual. Nossa linguagem muitas vezes nos confunde e nos trai.
Outro ponto é que temos o péssimo habito de falar e acreditar que todos pensam como a gente. Os outros não tem como pensar e agir como a gente e vice-versa, pois vivemos experiências e conhecimentos diversos.
Temos dificuldade de entender que pessoas são felizes com trabalhos que a nós não nos encanta, claro neste contexto, vem o que vocês falaram: vocação, competência, dinheiro, masoquismo….essa é a grande diferença as pessoas são diferentes e tem objetivos diferentes e são felizes quando atingem estes objetivos, mesmo que para nós na nossa realidade seja estranho, por isso a comparação é irrelevante, para não dizer errada.
A respeito de Kanitz, a mensagem que ficou para mim e que concordo, é que, seja qual trabalho que esteja realizando, temos que fazê-lo da melhor maneira possível, este hábito com certeza é indicador de sucesso. Lembrando o que disse um de vocês e que concordo também, todo trabalho sempre terá algo que não gostaremos e isso não significa que seremos infelizes. Outro ponto que temos que lembrar que na nossa caminhada profissional passaremos por caminhos diversos e que nem sempre acertamos no inicio e que no decorrer da caminhada vamos nos encontrando.
Para finalizar deixo meu depoimento: Sou muito feliz com meu trabalho! (Iara Schmegel, administradora, pedagoga)
Gostei do artigo,parabéns pelo conteúdo.
É cada imbecil que aparece…
A vida é curta e frágil demais para passarmos nossos meros dias restantes nos forçando a gostar de algo que não completa nossa essência e nos torna infelizes. Nem sempre faremos algo do nosso agrado, mas isso em momento algum delimita nossas oportunidades de encontrarmos o que realmente nos faz querer viver. O filme “Sociedade dos poetas mortos”, retrata muito bem esse aspecto do meio social, e quais as consequências da imposição das pessoas mediante à profissão que queremos seguir. Médicos, advogados e engenheiros são importantes, mas isso não quer dizer que todos os cidadãos devem gostar, e querer seguir essas carreiras, o mesmo acontece com agricultores, cozinheiros, artistas e pedreiros. Dessa forma, encontrar o que nos faz bem é a única maneira de não chegarmos ao fim da vida e percebermos que não vivemos.
Ótimo texto , na minha opinião ele está correto,devemos fazer isso mesmo,se não gostamos do trabalho não vai adiantar em nada fazer mal feito , é bem capaz de você for despedido ,então mesmo que não gostamos é bom procurar fazer certo .tem uma frase que eu gosto muito “certo pelo certo” ,as vezes eu paro e fico refletindo.
acho que em algumas situações é necessário tentar, mas em outras não, você não tem que ser obrigado a fazer o que não gosta / não quer.