Todo adolescente passa por uma crise muito pouco diagnosticada.
Vou chamá-la de “Crise dos Pais Imperfeitos”, que surge quando o adolescente descobre que o pai e a mãe não são as pessoas perfeitas que eles imaginavam.
Embora muitos pais nunca tenham insinuado nada nesse sentido, os próprios filhos os idealizam como perfeitos.
Como a maioria não o é, mais dia menos dia ocorre a grande decepção.
Muitos pais pioram a situação dando a entender que nunca erram, que sabem tudo e que são, em suma, o máximo. Até o dia em que o mundo desaba, e a verdade nua e crua aparece: ninguém é perfeito.
A maioria dos jovens sonha em ter pais perfeitos para sempre, um governo perfeito a cada eleição, em criar um mundo perfeito sem injustiças, onde até os grandes planos de governo funcionam porque serão sempre perfeitos.
Essa crise traz também uma enorme insegurança pessoal.
A redoma de vidro do pai herói e da mãe heroína se desfaz.
Uma crise dessas mal resolvida pode se agravar e se transformar em desilusão, desânimo, o que pode levar à exclusão social e à perda de ambição.
Pode também levar à depressão, às drogas e, finalmente, ao crime, já que o mundo não é mais perfeito.
Pode gerar desobediência à autoridade paterna, contestação e revolta contra os pais e as instituições que eles representam. Um perigo para a democracia.
É uma revolta injusta contra os pais, já que ninguém é perfeito, e que se manifesta como uma recusa de fazer parte da sociedade de forma construtiva e incentiva a inserção social de forma destrutiva e violenta.
Jovens se recusam a participar desta sociedade de várias maneiras, que prefiro não enumerar. Um dos sintomas é exagerar no intento de “ser diferente”, quando o normal é se inserir na sociedade sendo inovador e criativo.
Por isso uma separação na família é tão devastadora para a maioria das crianças, não por causa da separação em si, mas porque antecipa em muitos anos a “Crise dos Pais Imperfeitos”.
Quando ouvem o anúncio da separação, os filhos acabam tendo de lidar com duas crises ao mesmo tempo, e muitas crianças ainda são novas demais para aceitar a crise da imperfeição.
Elas ainda precisam daquela imagem dos pais unidos na perfeição.
Muitos brasileiros, se não a maioria, na fase adulta, projetam esse desejo de perfeição no mandatário de seu país. Muitas vezes projetamos nos nossos governantes uma imagem do pai perfeito. Isso ocorreu em relação a Getúlio Vargas.
Novamente exigimos uma perfeição que não é justo exigir. A crise política pela qual estamos passando tem alguns contornos dessa “Crise do Pai Imperfeito”.
Exigimos uma perfeição do governo que um presidente eleito nunca prometeu, e ficamos profundamente decepcionados e desiludidos com o primeiro deslize que aparece.
Por isso, alguns países sabiamente mantiveram as suas monarquias. O monarca encarna aquela figura do pai perfeito, e, como ele não faz absolutamente nada, não pode causar a menor decepção.
É uma figura preservada, todo mundo se sente seguro e feliz, e o país cresce.
Segundo a revista Economist, monarquias pagam muito menos juros e são economias bem mais estáveis que outros regimes.
O Brasil está parado economicamente desde 1998, devido às sucessivas crises políticas envolvendo importantes membros do governo.
Não estou defendendo a monarquia para o Brasil, mas, se essas crises políticas continuarem a paralisar a economia, talvez seja a hora de propormos a volta da família real e a criação do parlamentarismo, para o bem de todos.
Assim, teremos estabilidade sem juros altos e a volta do crescimento econômico, a um custo bem menor.
Diga aos seus filhos que você, os políticos, o governo e nossos presidentes não são perfeitos. Eu sei que a maioria dos pais adora mostrar o contrário, adora ganhar do filho num drible de futebol, com medo de que descubram a verdade.
Posso garantir que eles já o achavam perfeito muito antes de você se mostrar. O que eles precisam aprender é a verdade.
Portanto, mostre aos seus filhos que você não é perfeito. Ensine que não há utopias perfeitas, somente imperfeições a serem corrigidas. Comece de preferência nesta semana, aos poucos, para não assustá-los.
Publicado na Revista Veja, Editora Abril, edição 1847, ano 37, nº 13, 31 de março de 2004, página 20.
4 respostas
Muuuuuuuuuuuuuito bom!!!!
Como não tenho filhos, vou lê-lo pra minha mãe ainda hoje! Quem sabe assim ela aprende a lidar com minha irmã mais nova!?!? rsrsrs
Abraço,
Este seu texto me intriga !
É uma situação conflituosa q sai da sala de casa para o social. Talvez seja esse o tema para o meu livro!
Há uma determinada época vivenciada pelas familias brasileiras, q me parece ser o ultimo suspiro da “velha” educação – idos de 1968- ditadura militar
(tenho olhos mais não vejo, tenho boca mais não falo):- onde os pais se colocavam num pedestal, distantes dos filhos e daí vem a visão d perfeição.
Só “Deuses” são postos em pedestais e seus proprios seguidores crêem q devem obedecer. Deuses humanizados, pois o divino mesmo, que não é uma entidade, não se importar nem um pouco com isso.
Acho q as raízes da problematica de seu texto, são muitissimo profundas, talvez desde a idade média. Quem vai saber? A tempos a educação nas escolas, vem sendo ministrada pela igreja catolica e em alguns poucos paises a protestante. Creio q a visão de mundo do q seja Deus talvez seja a pedra filosofal, d td isso. Viajei ?
Quem não tem cão caça com gato. Quem não tem auto-estima caça com o ego(puro instinto de sobrevivência).
O orgulhoso não consegue pedi desculpas, muito menos reconhe q errou. É preciso humildade para isso. Assim são os pais e assim são os filhos que aínda não conseguiram perdoar seus HUMANOS PAIS E FILHOS.
A educação da pancada, o bater para educar, não educa nada, desenvolve mascaras, de: hipocrizia e corrupção.
Sim, porque a criança deixa de ser ela mesma, e se torna a ” boazinha” para agradar os pais. Ou seja hipocrita, vivencia um papel, um personagem e não a sua verdade. E o pior deixa de viver e passa a sobreviver.
Ver livro sobre educação de Hipolyte Denizard Rivail.