Como reduzir a dívida com toda esta má vontade política?
Só existe uma forma de reduzir os juros em um país.
A única forma de reduzir os juros é reduzindo a dívida.
Todos estes apelos para reduzir os juros diretamente são ingênuos, porque o problema é outro.
Se o governo chegasse para os bancos e dissesse: “Toma seu dinheiro de volta, não quero mais estes empréstimos caríssimos”, os bancos ficariam com um monte de dinheiro parado nas mãos e teriam de reduzir os juros e emprestar novamente para o setor produtivo.
O Estado pagaria juros menores, e mais importante, sobre um total de dívida menor.
Só que todos os nossos governos se recusam a devolver as dívidas que governos anteriores contraíram.
Não há interesse nem estímulo político em pagar o que o governo anterior tomou emprestado e gastou.
Todo prefeito, governador e presidente quer gastar em obras, para se reeleger.
Marta Suplicy se recusou a devolver uma dívida de um bilhão de São Paulo na época, e isso nos custou uns 30 nos próximos 20 anos.
Economistas do PT falavam abertamente em repúdio às dívidas.
Pagar dívida de outro, de fato, não tem a menor graça.
O ex-Ministro da Fazenda Delfim Netto ficou famoso em 1982, ao defender que “Dívida não se paga. Dívida se rola”.
Foi o que todo governo fez desde então, aumentando a dívida cada vez mais ao longo do caminho, e por tabela, os juros.
Como reduzir a dívida com toda esta má vontade política?
O truque seria enganar os políticos, levando-os a devolver finalmente a dívida de governos passados sem que eles soubessem disto.
Nisto está a sutileza e o maquiavelismo da Proposta do Deficit Nominal Zero.
A proposta agora não é mais “rolar a dívida”, mas que o governo pague todas as suas despesas incluindo o “Juro Nominal” da dívida.
1 O “juro” nominal não é juro, é uma ficção da Escola Nominalista, mas todo mundo, a imprensa, a maioria dos professores de economia, os próprios investidores acreditam.
O “juro” nominal é na realidade a soma de um juro real (o verdadeiro juro) mais uma inflação futura, ambos incertos.
2 Pagando-se os “juros” nominais na sua totalidade, a dívida não se manterá constante, como muitos irão acreditar, mas a dívida interna diminuirá em termos reais.
Portanto, o truque é esse.
A inflação embutida no juro, é uma amortização ou devolução do seu próprio empréstimo.
Você fica feliz achando que está ganhando um juro elevado, mas na realidade é seu próprio dinheiro que estão devolvendo.
Esta prática é feita para enganar o aplicador, que acha os “juros” maiores do que “realmente” são e o “juro” nominal mais atraente ao aplicador facilita a vida do Ministro da Fazenda, que tem de colocar títulos do governo no mercado.
Mas com um governo falido, isto se torna um tiro no pé. Nem devolver parte da dívida eles são capazes de fazer.
O Deficit Nominal Zero, simplesmente obriga o governo a reduzir despesas ao ponto de terem como reduzir a dívida em termos reais, e não mais como uma porcentagem do PIB como vinha acontecendo.
Agora a dívida cai mesmo, em vez de aumentar, embora menos do que o PIB. Se a inflação for de 3,5% em 2006, 3,5% da dívida interna será devolvida. Se em 2007 a inflação for de 9%, a dívida será corroída ou devolvida, via “juro” nominal, em 9%.
Este é o primeiro problema do plano, ele sofre da incerteza quanto a inflação futura.
O plano do Deficit Nominal Zero, nunca saberá ao certo em quanto a dívida será reduzida, muito menos quanto de despesas precisam ser cortadas.
Em termos de gestão o plano é impossível de ser gerido.
Se tivermos 100% de inflação a dívida cairia pela metade, mas o governo conseguiria cortar a metade de suas despesas?
O Deficit Nominal Zero, evita o uso das palavras Superavit e Lucro, palavras riscadas do ideário nacional.
Usam o termo Deficit, tão querido pelos intelectuais e economistas de governo.
O Deficit Nominal Zero é na realidade um Superavit Real Positivo.
Um investidor ficará mais tranquilo se ouvir que finalmente haverá de fato um Superavit Positivo ou se ele ouvir esta bobagem semântica de Deficit Nominal Zero?
Paulo Skaf, Presidente da Fiesp, também não entendeu a proposta, ao declarar em nome dos empresários de São Paulo, “Queremos um Superavit Nominal, ainda que seja de 1% ou menos.
Precisamos pagar todas as contas e juros, e ainda sobrar algum dinheiro.
Do contrário, não adiantará nada, o esforço será desperdiçado.”
Não há necessidade de se ter um superavit nominal, o Deficit Nominal Zero já é superavitário, vai sobrar dinheiro até para devolver parte da dívida!
Todos os economistas entrevistados nos primeiros dias de discussão não entenderam.
Uns falaram que só daria para reduzir a dívida se reduzisse os juros, ou seja, justamente o contrário da proposta do Delfim.
O que preocupa é que mentira tem perna curta.
Algum professor de Economia da Unicamp vai ler este meu artigo e descobrir a verdade.
É tão elementar o truque proposto, que não demorará outros descobrirem o que escrevo por si mesmos.
E o plano já recebe “fogo amigo” da Fiesp, porque o plano não é claro, como tudo no Nominalismo.
E se não é claro, como fazer um choque de gestão, se gestão requer ação conjunta sobre metas claras e definidas?
Se não é claro, por que os “juros” iriam despencar de um dia para outro, por que os investidores ficariam mais tranquilos com esta falta de clareza? Um economista realista ou administrador financeiro teria proposto algo muito mais operacional e transparente.
Teria proposto uma política onde o Estado se comprometeria a pagar a totalidade de um juro-real, transparente e definido, o que por si só reduziria os juros pela metade. Seria o juro de mercado, o que permitiria o Banco Central a fazer uma política monetária.
Pérsio Arida também não entendeu o plano do Delfim.
Ao mesmo tempo, o Estado se comprometeria a devolver ao povo brasileiro, digamos, 3, 4 ou 5% da dívida interna ao ano, ou outra taxa politicamente viável.
Seria uma política clara e transparente, o que reduziria ainda mais os juros, por antecipação.
Em 10 anos poderíamos reduzir a dívida em 30, 40, ou até 50%.
De uma forma clara e transparente. Isto sim, reduziria os juros. Na fórmula do Delfim, daqui a 10 anos a dívida terá sido reduzida em quanto? Ninguém sabe, mesmo depois de 10 dias de manchetes, com mais de 50 economistas sendo entrevistados.
Assusta a persistência do pensamento Nominalista neste país que engloba praticamente todas as faculdades de economia daqui, e está por trás de quase todos os nossos erros econômicos nesta história recente.
O brasileiro quer ser enganado para sempre? Engenheiros, contadores, juízes, advogados, professores, psicólogos, querem ser enganados por economistas Nominalistas para sempre?
Vocês querem comprar títulos que dizem pagar 19,75% de “juros” nominais, e achar que estão de fato ganhando esta mentira para sempre?
3 Pior, O Deficit Nominal Zero, deixará os banqueiros torcendo por uma inflação zero, o que mantém a dívida e os juros como estão.
Os industriais, por sua vez, irão torcer por uma inflação de 20%, para que o governo devolva rapidamente a dívida, permitindo que estes recursos sejam reciclados pelos bancos para uma atividade produtiva.
Uma Ideia Antiga.
A ideia do Deficit Nominal Zero é antiga, e foi a causa da estagnação da economia brasileira por 10 anos. A década perdida!
Na crise da dívida externa, nossos ministros da economia, incluindo Delfim, adotaram esta ideia, sem saber.
Nossos economistas Nominalistas da época não perceberam que ao pagar o “juro” nominal aos bancos internacionais, eles estavam pagando muito mais do que os juros, estavam também amortizando a dívida, de forma acelerada, antecipada e injusta.
Gerou uma recessão brutal e desnecessária, mas reduziu, como previ na época, a dívida em termos reais a ponto de não ser mais um problema nacional. Mas, se Delfim tivesse estudado economia real e não nominal teria percebido na época que este mesmo Deficit Nominal Zero foi exatamente o que o FMI e os Bancos na época nos impuseram.
Deficit Nominal Zero não é um plano administrativamente bem construído, porque seus resultados dependem de fatores fora de seu controle, isto é, a inflação futura, mas é um enorme avanço no pensamento social-democrata deste país, ao admitir que dívidas precisam ser devolvidas após um certo tempo, e que a sociedade, o povo e seus trabalhadores não podem pagar juros indefinidamente só para manter a dívida na mão do Estado.
Talvez, somente com a ilusão monetária que o Deficit Nominal Zero proporciona, ao não revelar as suas verdadeiras intenções, possamos iniciar o processo de redução da dívida interna.
A clareza e transparência do Realismo Econômico viriam depois.