O Patrimônio Líquido Nacional

A ciência econômica infelizmente nunca desenvolveu o conceito de Patrimônio Líquido, utilizado por todos os contadores, analistas e administradores quando avaliam o desempenho das empresas.

Para medir o desempenho de um país, preferiu-se usar o conceito de Produto Interno Bruto, aquilo que se produziu durante o ano avaliado.

Tanto faz para a Ciência Econômica se o produto dura um mês ou vinte anos para ser incluído no PIB.

Tanto faz para a Ciência Econômica quantos meses duram sapatos, casas, imóveis, celulares, TVs, computadores, eletrodomésticos, carros, calçadas, estradas, pontes, prédios, vidros, tinta etc. que entram no cálculo do PIB.

Riqueza, sob essa definição, é quanto uma geração gasta por ano, e não quantos anos um produto é útil, ou quanto uma Economia deixa de herança para a próxima geração.

Por isto estamos num mundo de desperdício, consumismo desenfreado, destruição do meio ambiente, porque nossos governos ouvem as pessoas erradas, e usam as métricas e “benchmarks” equivocados.

Usar uma medida criada por Adam Smith, em Riqueza das Nações, por 300 anos, é algo assustador. Mas é algo que a imprensa e nossos formadores de opinião não questionam.

Se usássemos o conceito de Patrimônio Líquido Nacional, saberíamos por exemplo que o país A, que fabrica produtos que duram cinco anos, é cinco vezes mais rico do que o país B, que fabrica produtos que duram somente um ano.

Porém, para o FMI esses dois países são rigorosamente iguais.

Na Índia, país considerado pobre por todos, você encontra televisões, bicicletas, geladeiras e carros de 1960 ainda rodando. Vivem quebrando, mas para um pobre que ganha 1 dólar por dia, gastar um dia consertando não é um grande custo.

Ou seja, a Índia é muito mais rica do que se pensa,

Talvez seja por isso que o Brasil não se preocupa com qualidade total, durabilidade e confiabilidade, tão discutidas em administração.

Para que incentivar serviços públicos de qualidade, por exemplo, se entram no PIB do mesmo jeito?

Nossas estradas são feitas para durar só quatro anos, até a reeleição.

Ou, para que se necessite tapar buracos depois aumentando duplamente o PIB?

Os três livros de introdução à economia mais usados no mundo nem incluem a palavra durabilidade no índice remissivo. Veja Mankiw, Formação Ecônomica do Brasil-Celso Furtado, Samuelson.

Não é considerada uma variável econômica, como juros e câmbio, analisados exaustivamente em capítulos inteiros dedicados ao assunto.

Tanto é que os governos de 1964 para cá criaram dezenas de “incentivos” para produzir no Nordeste, mas não para produzir produtos “durabilidade acima da média”.

Tivemos políticas econômicas para “substituir importações”, mas não para produzir produtos resistentes.

Tivemos políticas para “exportar e gerar divisas” mas não para fazer produtos com qualidade.

Nunca nossos Ministros da Economia criaram incentivos fiscais para aumentar a durabilidade dos produtos que fabricamos, o que para um país pobre seria uma importante solução.

Mas a ditadura da métrica equivocada do PIB gera outras consequências nefastas, que na Administração Econômica, na mão de administradores, jamais teríamos.

Nossos “desenvolvimentistas” nunca lutaram pelo financiamento de casas usadas, que os mais pobres poderiam comprar, porque imóvel usado não entra no PIB pelo qual eles são avaliados.

As geladeiras de nossos avós duravam vinte anos, até que inventaram a chamada “obsolescência programada”, obrigando os consumidores a comprar uma nova geladeira a cada cinco anos, o que aumenta o PIB, mas reduz violentamente o patrimônio nacional.

Países ricos, local de origem dessas teorias, incentivam a obsolescência programada porque neles o consumidor já tem tudo.

Isto leva a políticas econômicas que estimulam a inovação e obsolescência para criar um jeito de o consumidor jogar fora o produto antigo, comprar um novo e assim aumentar o PIB.

Pobre não quer nada disso; pobre quer durabilidade, qualidade e confiabilidade para não ter de comprar a mesma coisa duas ou mais vezes na vida.

Ele quer uma geladeira que dure, que possa ser revendida como usada sem perder metade do valor e que tenha peças de reposição disponíveis por vinte anos.

Lutar por uma melhor distribuição de renda no Brasil para que pobres possam em seguida comprar produtos descartáveis não resolverá o nosso problema da pobreza, algo que Celso Furtado, Guido Mantega e Dilma não percebem.

Será que nenhum jornalista econômico não percebe essa contradição? Claro que não.

Se calculássemos o Patrimônio Líquido Nacional descobriríamos que nosso patrimônio líquido não para de cair com os direitos e dívidas criados pela Constituição de 1988.

Que esta geração está longe de deixar um patrimônio para seus filhos, mas deixará uma monstruosa dívida pública e atuarial.

Talvez por isso ninguém ouse calculá-la.

Criamos uma economia mundial que incentiva produtos descartáveis, criamos uma sociedade consumista, predadora e destruidora, tudo isso para maximizar o PIB.

O endeusamento do PIB e do pleno emprego como meta política é a causa do aquecimento global, da destruição da ecologia, do desmatamento florestal, da poluição global e do crescimento exponencial do lixo.

Algo para se pensar

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Comentários

2 Responses

  1. Excelente artigo.

    Acredito que, mesmo do ponto de vista dessa economia “estreita”, focada apenas no PIB e no pleno emprego, o investimento em produtos de alta durabilidade pode sim valer a pena. Afinal, o dinheiro investido a cada 2 ou 3 anos em determinados eletrodomésticos e artigos tecnológicos poderia ser direcionado para outros produtos da mesma classe (uma segunda ou terceira televisão, um freezer ao invés de comprar uma geladeira) ou ainda para atividades como turismo, entretenimento… coisas que manteriam o dinheiro circulando, bem como o índice desejado de PIB e emprego.

    No entanto, o “esforço” necessário para se fabricar produtos mais duráveis implica, em grande parte das vezes, na compra de patentes e no investimento em pesquisa e desenvolvimento tecnológico. E esse tipo de investimento ainda é visto como “custo” pelo governo e pelas empresas no Brasil – embora eu reconheça que a situação melhorou nos últimos anos.

    Certamente, os economistas deveriam fundamentar melhor os seus conceitos, mas não acredito que, de uma forma geral, a Índia escute os economistas certos e nós os errados. Parece-me que a situação é um pouco mais complexa e que o Brasil precisa adotar uma cultura de geração de patentes, parceriais com universidades e importação de conhecimento aplicado (trazendo cientistas e engenheiros de fora para cá), a fim de montar centros de P&D dentro das nossas empresas. Por aqui, infelizmente, os estagiários e trainees das grandes empresas são doutrinados com normas corporativas/corporativistas e boatos do ambiente de trabalho, isso quando não estão sendo utilizados para tirar xerox e buscar quitutes na confeitaria do bairro.

  2. Na faculdade havia visto uma ideia parecida no livro do Guerreiro Ramos, o qual dizia que o PIB não mensurava a riqueza dos países, mas apenas as transações comerciais, ou seja, se um bem o um serviço fosse produzido e utilizado, mas não comercializado, não entraria no PIB. Não se considerava propriamente o conceito de valor.
    A tua explicação, para a produção de bens ou para atividade primária, é muito mais clara, objetiva e simples.

    Como não vi isso na faculdade?

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