O Intelectual de Uma Variável Só

O Brasil é vítima de cientistas fake, que eu chamarei de “Intelectuais de Uma Variável Só”.

Como aqueles que afirmam que se combate inflação como uma taxa de juros nominal de curto prazo e nada mais. Ou que o problema da nossa dívida são os bancos, que o problema do Brasil é devido a concentração de renda.

Para verdadeiros cientistas é obvio que o mundo é mais complexo do que isso, por isso nós sempre analisamos n variáveis.

Mas infelizmente nossos jornalistas preferem e só divulgam diagnóstico fácil.

Enquanto alguns intelectuais sérios se debruçam sobre modelos complexos que tentam captar a realidade como ela é multifacetada, imprevisível, sistêmica, outros ganham os holofotes apontando um único culpado para todos os males do mundo. Racismo. Capitalismo. Desigualdade. Patriarcado. Clima. O que for.

Devo ter sido um dos primeiros economistas a usar planilha econômica, era o Visicalc na época, e que me permitiu simular dezenas de variáveis ao mesmo tempo, vide Superestimação da Inflação, nada menos que 40 anos atrás.

Nossa inflação continua sendo superestimada porque a maioria dos economistas não sabem ler planilhas somente regressão lineares.

Mas no Brasil são os intelectuais de uma variável só que mais fazem sucesso.

Eles são adorados pela mídia, pelas redes sociais e por políticos em busca de slogans.

Eles entregam aquilo que o mundo moderno mais deseja: simplicidade com autoridade. Uma explicação única. Um vilão claro. Um remédio fácil.

Mas a realidade é outra.

Problemas sociais, econômicos e culturais são, por natureza, multicausais.

A criminalidade, por exemplo, não é “só” fruto da desigualdade, da pobreza, ou do racismo estrutural. É uma combinação complexa de fatores: colapso familiar, ausência de instituições, impunidade, incentivos distorcidos, baixa capacidade estatal, normas culturais, entre outros.

No entanto, a narrativa que aponta “um único fator explicativo” é mais sexy. Mais digerível. Mais vendável.

E assim, quem mais simplifica, mais influencia.

Os intelectuais mais responsáveis, que ponderam múltiplas variáveis, admitem incertezas, são justamente os que menos aparecem.

Contudo eles não viralizam, suas análises não cabem em tweets, suas conclusões não alimentam paixões ideológicas. E, por isso, são esquecidos, mesmo quando estão mais próximos da verdade.

 Como Resolver Esse Problema?

1. Expor os custos da simplicidade: Toda simplificação é uma mutilação. Devemos exigir de nossos intelectuais modelos com variáveis reais.

2. Criar incentivos à complexidade: Se o ambiente intelectual premia certezas e frases de efeito, teremos sempre mais ideólogos que pensadores. Precisamos recompensar quem estuda, compara, duvida.

3. Ensinar a pensar em sistemas, não em slogans: A formação educacional precisa sair do binarismo (“culpa do mercado” vs. “culpa do Estado”) e cultivar a análise sistêmica. O mundo é feito de interações não-lineares, feedbacks, termo que nunca traduzimos, e efeitos colaterais, não de causas únicas.

4. Confrontar os intelectuais-celebridade com variáveis ausentes:

Pergunte sempre: o que está faltando na equação? Qual é a variável que o guru ignora porque complica sua tese?

O verdadeiro pensador ilumina. O pregador apenas inflama.

Enquanto celebramos quem grita certezas, talvez estejamos ignorando quem sussurra verdades incômodas, mas reais.

A história tem sido cruel com os intelectuais de uma variável só. Seus diagnósticos podem até conquistar o presente, mas quase sempre afundam o futuro.

Talvez esteja na hora de pararmos de premiar quem tem respostas simples e voltarmos a ouvir quem tem perguntas sérias.

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Comentários

Respostas de 2

  1. Muito esclarecedor e ponderado. Acredito que existam muitos profissionais competentes, entretanto como citado no texto, não são apreciador.

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