Uma das razões que não existe filantropia no Brasil é a falta de organismos que avaliem a capacidade administrativa e idoneidade de nossas ONGs.
Maior que o medo de jogar dinheiro fora, é saber que o rico foi enganado, o que afetaria a sua reputação de empresário e empreendedor. Tentei por vários anos convencer a Editoria da Revista Exame a criar um “Melhores e Maiores” do Terceiro Setor, sem sucesso.
Por isto, larguei este projeto e fui criar o Prêmio Bem Eficiente, sem a ajuda da Abril.
Usando 42 medidas diferentes para definir a nossa equação de pontuação de caridade, mais pontos de dados usados em Melhores e Maiores, que eram 6. Isto porque ONGs são muito mais difíceis de avaliar, fato que já é conhecido para a maioria dos filantropos.
Uma das razões de ser, como eu já mencionei, é a falta de métricas eficazes como os lucros ou participação de mercado quando se trata de instituições de caridade.
No entanto isso não deve impedir-nos, só faz a análise mais difícil, exigindo a identificação de proxies substitutos para variáveis como eficiência e rentabilidade.
De um ponto de vista estatístico, isso só significa que a variância da nossa classificação de instituições de caridade é um pouco mais ampla do que a de empresas.
A probabilidade de uma instituição de caridade ser erroneamente classificada como AAA quando na verdade é apenas AA é maior do que quando estamos classificando dívida sênior de empresas listadas.
Tivemos de usar medidas mais indiretas, como a periodicidade das reuniões do conselho, por exemplo.
Sabemos que os conselhos que se reúnem todos os meses são mais eficientes que aqueles que atendem a cada seis meses, em termos de gestão.
As 42 medidas usadas pelo Prêmio Bem Eficiente são basicamente divididas em seis grandes áreas.
1. Eficácia administrativa
2. Crescimento
3. Estabilidade financeira
4. Qualidade dos controles administrativos
5. Conformidade legal
6. Reconhecimento público
Cada uma das 42 variáveis ou medidas de desempenho é quantificável; não há uma única medida subjetiva no processo.
Isto é o que faz a seleção científica. Qualquer pessoa que utilizar os mesmos critérios e o mesmo conjunto de dados, obterá a mesma seleção de instituições de caridade.
Compare isso com o processo de seleção costumeiro para a premiação das ONGs.
Normalmente, 10 representantes do setor de caridade se reúnem com uma xícara de chá à tarde e selecionam 10 projetos de uma lista de candidatos submetidos não se sabe como.
Dependendo do humor dos 10 membros ao acordar de manhã, os resultados podem ser completamente diferentes.
Se os mesmos membros da comissão se reunissem novamente seis meses depois, após um ataque de amnésia, eu aposto que os resultados vão ser completamente diferentes.
Pode-se criticar os critérios utilizados, pode-se questionar que o número de variáveis deve ser de 50 ou 55, mas não se pode questionar que o resultado é subjetivo.
Nós criticávamos nossos critérios a cada ano, se deveríamos excluir alguns, e incluir outros. Mas nas simulações que fazíamos, na maioria das vezes os resultados seriam os mesmos.
Nos 24 anos que conduzi “Melhores e Maiores”, nunca recebi uma acusação de favoritismo ou nepotismo, algo raro no Brasil.
Um dos tipos mais comuns de crítica era porque nós não desenvolvemos critérios específicos para alguns setores, para a saúde e educação, por exemplo.
Isto é mais difícil do que se pensa, e os resultados de muitos projetos só podem ser medidos 10 anos para a frente.
Mas no Prêmio Bem Eficiente estávamos tentando classificar diferentes instituições de caridade em campos diferentes, e isso exige denominadores comuns.
Também estes critérios de avaliação setorial específicos não são fáceis de determinar objetivamente. Ensino pode requerer um período de 30 anos de avaliação, por exemplo para ser capaz de avaliar se era de fato eficaz.
A essência da nossa avaliação é a administração, a transparência, o fluxo de informações.
A propósito, “Melhores e Maiores” e análise de ações na Bolsa seguem a mesma regra básica.
Nenhum analista de empresa americana de Wall Street dirige todos os carros da GM ou usa fraldas da Procter & Gamble, antes de emitir uma recomendação de compra.
Eles basicamente analisam a administração e a estrutura financeira dessas empresas.
O que sempre me perguntavam, até o Prêmio Bem Eficiente ser descontinuado por falta de interesse da sociedade brasileira, é se o refinamento novo ou variável nova realmente adicionaria valor ao processo.
Mais frequentemente que não, a nova classificação ou lista de instituições de caridade sai praticamente a mesma, identificando digamos 49 das originais 50 instituições de caridade premiadas.
Quando você já tem 42 variáveis, a próxima geralmente contribui muito pouco. Nós realmente poderíamos estar outorgando o Prêmio Bem Eficiente usando apenas 17 variáveis, com praticamente o mesmo grau de confiança com a utilização de 42.
Mas nós preferimos esta redundância porque estamos pisando em terreno novo.
A outra coisa que aprendemos com o Prêmio Bem Eficiente é que instituições de caridade bem administradas normalmente mantêm um padrão de excelência em tudo que fazem.
Por isto o Prêmio Bem Eficiente se tornou tão cobiçado e merecido para aqueles que o receberam e foi um marco na história da filantropia.
Pena que os patrocinadores decidiram voltar suas verbas para Responsabilidade Ecológica e Ambiental, onde o mico preto se tornou mais importante do que cegos e paraplégicos.
Vá entender!
2 respostas
Olá Kanitz.
seria interessante construir uma avaliação para os partidos políticos, para avaliar eficiência administrativa, crescimento, interesse público dos projetos, reconhecimento público, conformidade legal, nível de corrupção do partido, etc…
Boa tarde Professor,
Este artigo foi ao mesmo tempo alvissareiro e triste, posto que acabou. Poderia dar-nos a conhecer os dados e resultados de algum perído do Prêmio.