Precisamos de Estagiários no Congresso

Todo dia alguém reclama da qualidade dos nossos políticos e da incompetência dos nossos governantes.

Infelizmente, cada povo tem o governo que merece.

Afinal, não incentivamos os jovens a serem políticos, não ajudamos os mais competentes a se eleger, nem sequer sabemos onde fica a sede do partido político em que votamos, não identificamos quem poderia ser um bom político no futuro.

Pergunte a 100 universitários que profissão escolheram e a maioria responderá administração, medicina, engenharia ou advocacia.

Poucos dirão que pretendem seguir a carreira política.

Tanto é que a nota de corte do vestibular de Sociologia e Política é uma das mais baixas de todas as profissões. Na USP, por exemplo, é 76 contra 117 de medicina.

Nenhum país consegue tornar-se uma nação séria e respeitada se a carreira de político não consegue atrair seus melhores cidadãos de uma sociedade.

Desde Platão já havia essa constatação.

Durante o regime militar, a carreira de político, de fato, deixou de ser interessante, atraindo poucos jovens, e por isso tivemos pouca renovação.

Deplorar constantemente a qualidade de nossa classe política, sem fazer absolutamente nada para mudar esta situação, é uma atitude cínica e complacente de quem critica.

Temos de fazer algo.

Uma das primeiras lições de Administração, é que a qualidade do produto depende dos seus insumos.

Se os próprios candidatos são de baixa qualidade, os eleitos também o serão.

É tão óbvia esta constatação, mas somente um Partido como o Bem Eficiente é composto por administradores, engenheiros, contadores que entendem o mínimo de eficiência.

Existem excelentes políticos no Congresso, sem a menor dúvida, mas precisamos aumentar seu número.

Como atrair nossos jovens, que atualmente preferem ser médicos e engenheiros, para que se tornem políticos competentes?

Há trinta anos, a sociedade americana, criou um programa chamado Pagers, que iremos adaptar para a realidade Brasileira, chamando o programa de Estagiários no Congresso.  

Pager era um menino de recados, que levava bilhetes de lá para cá, neste caso entre Senadores e Congressistas americanos em plenário.

Ser escolhido Pager era o máximo, uma honra e uma curtição.

Os detalhes devem ter mudado, mas do que me lembro na época, cinquenta jovens do primeiro colegial, escolhidos pelos colegas entre os representantes de classe ou do grêmio, e com as melhores notas acadêmicas das escolas de cada Estado americano, eram designados Pager por três semanas, e lá iam todos para a capital da república.

Nessas três semanas, entravam em contato com os congressistas e líderes da política americana.

Participavam, de certa forma, dos bastidores do poder, ouviam as discussões e as fofocas de plenário e voltavam à terra natal para serem substituídos por outros cinquenta estudantes. No final do ano, uns 500 já tinham passado pela experiência.

Muitos percebiam que havia algo muito bem mais nobre na vida do que ser médico ou engenheiro.

Em vez de se tornarem grandes administradores, ou financistas, alguns desses melhores e brilhantes alunos optaram pela carreira de políticos e escolheram a faculdade apropriada.

No ano passado, ao visitar o Congresso Americano, indaguei qual havia sido o efeito concreto daquele programa.

Descobri que 10% dos congressistas americanos atuais e seus auxiliares diretos, eram ex-pagers.

Portanto, alguns dos melhores alunos de cada Estado americano estavam lá, e haviam sido influenciados por aquela singular experiência como pager a mudar de carreira.

Um projeto desses custaria menos de 10.000 reais por mês em alojamento e alimentação, e outro tanto de passagem de avião.

Alguma organização civil há muito tempo deveria ter patrocinado, pois economizaria para a nação bilhões em impostos a longo prazo.

Um programa brasileiro precisaria de algumas adaptações ou pode muito bem ser diferente.

Poderíamos enviar o melhor aluno da escola, com aquele que mostrasse dom político, 2 por escola.

Assim, ambos aprenderiam um pouco do outro – o estudioso a ser mais político, e o político a ser mais estudioso.

Os melhores alunos de cada Estado iriam ser Estagiários de Senadores. Os melhores alunos de cada Cidade seriam estagiários de Deputados Estaduais.

Seriam entrevistados pela imprensa, abririam seus blogs, mostrariam as suas ideias para os velhos políticos, seriam heróis nas suas cidades natais e futuros vereadores.

Seriam os mais inteligentes e não os mais espertos.

Dezenas de outras ideias obviamente terão de ser desenvolvidas e implantadas para ajudar a melhorar o atual quadro político.

 

Publicado na Revista Veja edição 1656, ano 33, nº 27 de 5 de julho de 2000,

Sem nenhuma reação do resto da imprensa brasileira, o assunto morreu.

Michel Temer foi o único que nos procurou na época, mas não conseguimos apoio de nenhuma entidade filantrópica, ou associação patronal. A impressão que temos é que muitos querem o Congresso exatamente como está.

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Comentários

16 Responses

  1. Achei tantástica. Seria muito interessante. Mesmo os Grêmios Escolares que de certa forma estimulavam o aparecimento de líderes estão mortos.

  2. Muito interessante esse artigo. Sou socióloga e doutora em planejamento urbano e regional pela UFRJ, professora de diversos cursos de pós-graduação dessa universidade, e, a partir de 2010, da disciplina Ciências Sociais para a Gestão Pública, no Curso de Graduação Gestão Pública para o Desenvolvimento Econômico e Social, que ajudei a criar. Na interação com os alunos desse curso (jovens entre 18 e 20 anos), pude observar como eles tem interesse em contribuir para mudar o quadro político e social brasileiro e como precisam de orientações nesse sentido. Alguns deles estiveram comigo, voluntariamente, trabalhando na atualização do Plano Para o Desenvolvimento Comunitário em Cidade de Deus, em processo desencadeado por organizaçãoes locais para estabelecer um diálogo qualificado com o poder público. Por outro lado, na atuação social no gerenciamento de projetos comunitários, tenho percebido, ultimamente, que estamos precisando dar um salto de qualidade na ação política e social, sob pena de “empoderarmos” a precariedade. A sociedade brasileira já é democrática, mas a nossa democracia precisa ser muitíssimo melhorada. Quem sabe fazemos um evento na universidade sobre esse tema? Se você ou qualquer pessoa tiver interesse nisso, entre em contato comigo, para planejarmos algo que gere algum impacto.

  3. Senhor Kanitz,
    Ter idéias…até que é fácil/barato…”operacionalizar é que é…”.O cineasta brasileiro Sr. Salles,(na revista Bravo) falou que fez um filme “para se curar”…A qualidade dos “insumos” no sistema político é a oferecida pelas “famílias brasileiras”? Se reuniões de afiliação a partidos é espaço de “alto risco”…para famílias…?” por onde + os “insumos de qualidade” podem afluir ?
    Bom dia !

  4. só tem um problema: nossos “pagers” se contaminariam nesse lamaçal de corrpução e fisiologismo. O ideal seriam que fizessem estágio em páises sérios e de tradição democrática onde ser político é uma arte nobre e uma honra servir o país.Caso contrário continuará a mesma coisa.

  5. Não há democracia nem dentro dos partidos políticos. O que vemos tradicionalmente, são os mesmos nomes ano após ano, que mandam nos partidos. Sem reforma não há espaço para os novos. Quem vai querer entrar para o partido político e ter que apor seu nome para disputar uma vaga junto com figuras que há 30, 40 ou 50 anos costuram sua permanência?
    Não vejo como exemplo perfeito mas fico admirado ao ver a cada eleição americana, o surgimento de novos nomes. E ainda falam aqui no Brasil em lista fechada. Vai criar uma ainda maior reserva de mercado para essas rapozas velhas. Infelizmente, sem reforma politica, somente nos livramos no “nome” quando o cidadão morre. É fato.

  6. j’a pedi solicitacao para seguir o @PBE_2014 e divulgeui no meu twitter. Alguma coisa tem que ser feito para formar bons politicos. Punir quem erra ‘e fundamental. Gostaria que a imprensa divulgasse mais as acoes dos politicos que trabalham corretamente

  7. Kanitz
    Eu não voto em quem eu quero. Eu voto em quem o partido empurra, impõe, normalmente são so que fazem parte da corriola do chefão, da raposa velha de plantão.
    Para mim a questão é: como opinar na escolha dos candidatos?
    Ainda, porque os cargos no executivo só tem reeleiçâo e para o legislativo é infinito?
    Sugiro que no legislativo também houvesse
    um limite, assim haveria rodizio e apossibilidade de aparecerem outros politicos que mereçam o título.

  8. Sou seguidor do @PBE_2014 e sou completamente a favor desta idéia, precisamos dar dignidade ao nosso Amado País!
    Parabéns!!!!

  9. Caro Kanitz, Os legislativos no Brasil, são “lugares impróprios para menores” como de resto outros setores públicos. Em sua maioria, nos brasileiros, votamos olhando para o interesse individual, mais precissamente pensando em obter algum previlégio. Poucos votam no interesse coletivo e nosso senso de jsutiça é muito baixo e está baseado no “levar vantagem”. O sistema politico brasileiro filtra pelo pior. Penso que somente o parlamentarismo tradicional nos levaria a uma mudança verdadeira.

  10. Gostei, já solicitei o folow no twitter, em que mais posso ajudar? Sou formado em Administração de Marketing e tenho uma agência de publicidades em Sinop no interior do MT e estou disposto a trabalhar pelo PBE.

  11. Como seria ,em linhas gerais, o estatuto desse partido? Como seriam escolhidos os candidatos? Receberia doação da iniciativa privada? E parlamentar que não agisse de acordo com o estatuto do partido, seria expulso? Mesmo sabendo que a perda de um parlamentar, diminui o espaço político desse partido? A maioria dos partidos, tem a sua ala de jovens, tem a juventude tucana, a juventude petista, juventude demista e assim por diante e não me parece que os quadros formados nesses partidos são muito diferentes dos antigos. Vai me dizer que o clã Sarney, o Clã dos Magalhães (da Bahia), o clã dos Tumas e assim por diante, esse povo é todo mal formado? O problema no meu modesto entendimento é: falta de acompanhamento da população dos seus eleitos, financiamento privado de campanha, deputados eleitos com dinheiro das empresas de saúde, por exemplo, jamais votaram projetos que contrariem esses interesses. E para isso é necessário uma reforma política e não mais um partido. Essa história de PBE é um bom mote pra palestra e artigos de revista, mas não resolve o problema político prostituído que está aí.

  12. Kanitz, com todo respeito, às vezes acho que vives num mundo irreal. Tentemos ser apenas um funcionário público e verás que em nome da “política” tudo pode, menos tentar alterar o status quo.
    Os “cargos de confiança”, os políticos eleitos, os funcionários públicos de carreira, nada podem contra os grupos de poder do poder estabelecido.
    “Determinismo histórico”, dirás. “Mais uma “marxista” (que nada sobre sobre Marx, aviso eu)se manifestando, também dirás.

  13. Kanitz,
    A Câmara Federal tem tomado medidas para aproximar os jovens da política.
    Programas como o câmara mirim e o Parlamento Jovem q sao espécies de concurso de idéias entre as crianças e jovens, no qual os vencedores participam de uma Sessão simulada no Plenário para defender seus projetos e submete-los a votação. E tb há um programa parecido com o pagers. O estagio-visita precisaria ser adaptado com relação às indicações. Como atualmente o deputado cede a passagem aerea de sua cota, ele é quem indica o estagiário. Seria melhor uma escolha mais institucional, ou por concurso como o Parlamento Jovem, para se aproximar mais da sua idéia. Vale a pena dar uma olhada.

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